Você já disse "eu te amo" hoje?



Quando ela era mais jovem, ainda menina, era tão fácil burlar a timidez e escrever cartas de amor. Ela dizia "te amo" para o vento, para as flores, e todos os "eles" que encantaram seu coração. Mesmo quando as cartas eram rasgadas, ou quando riam de si, mesmo assim... sua boca não calava quando o coração sentia. Dizer era tão natural quanto sentir.
Engraçado ( ela nem sabe se é mesmo engraçado) que, quando se cresce, falar sobre essas coisas fica mais complicado, mais difícil. Nem é timidez, nem é ausência do sentir. Vai ficando mais difícil diante da descrença do outro, da não reciprocidade, de ter que provar que o que se sente é de verdade. É de já ter dito tantas vezes quantas foram verdadeiras, e sentir o coração quebrar. É perder aos pouquinhos um pedacinho de inocência e frescor, de dar com alegria e de receber sem temor. É saber que muitos já foram, e se sentir insegura diante do que se vive. 
Parece que foi ontem que ela escreveu sua primeira cartinha de amor. Ela tinha 7 anos. Foi logo que  aprendeu a escrever... o amor já brotava em si feito flor, e a palavra foi a forma de fazê-lo desabrochar. 
E o que mudou? Hoje ela acha que o amor é mais fácil de sentir do que dizer. Cada ser tem sua forma de amar, mas já é muito esperançoso acreditar que todas essas formas serão compreendidas. Há uma tendência a valorar como verdade o amor que se parece com o da gente, aquele que é confiável e seguro porque é conhecido. Qualquer desviante da norma é punido com a dúvida. E num é que a dúvida sufoca? 
Já foi fácil dizer "eu te amo" um dia...
Hoje ela tem vergonha.
              tem medo.
              tem desconfiança. Sabe-se lá o que o outro fará com a sua confissão!
Ela acha que este amor está mais protegido e em liberdade, se estiver preso dentro de si mesma. E quem pode julgá-la? Esses outros que sabem tanto do amor quanto ela... 
Só que o que ela ainda não percebeu é que dizer é só mais uma forma de se mostrar, que no dia a dia ela diz em todas as línguas que compreende: quando compartilha sua alegria e sua dor, seus medos e esperanças; quando o traz para perto de sua vida; quando se entristece quando ele se ausenta; quando se enraivece quando ele se fecha; quando deseja que o futuro seja generoso e bom para ambos; quando luta contra suas inseguranças para estar mais perto dele; quando se esforça em esquecer as palavras que lhe ferem; quando é ela mesma, mesmo que nem sempre uma pessoa agradável, mas verdadeira.
E o que ela esqueceu é que silencia porque seu próprio amor lhe basta, assim como lhe basta saber que ama, porque esse sentimento preenche cada espaço dela e lhe satisfaz. E é por isso que ela escrevia e dizia com tanta facilidade, porque isso era tão claro que a aceitação ou negação do outro nem era o X da questão. E ela foi esquecendo disso tudo com o passar dos anos, porque as pessoas esquecem muitas coisas que deveriam sempre lembrar. 
Ela esqueceu, e se entristeceu, e sofreu, e calou.
Há algumas coisas esquecidas que é preciso aprender de novo.

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